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Blog do Dr. Cristiano Nabuco

Trabalho e família: uma combinação delicada

Dr. Cristiano Nabuco

26/03/2014 09h00

© weseetheworld - Fotolia.com

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É incrível notar que nos dias de hoje existe uma imensa quantidade de pessoas que se preocupam com sua realização profissional e que, devemos concordar, não seria grande novidade.

Entretanto, para uma parcela expressiva desse grupo, sejam eles homens ou mulheres, trabalhar significa muito mais do que apenas prosperar, mas se tornou um de seus principais objetivos de vida. Assim, são indivíduos que, literalmente, abriram mão de toda sua existência privada para mergulhar nas demandas do trabalho, pois acreditam que a felicidade estará na realização profissional.

Não precisamos fazer muito esforço para localizar algumas dessas pessoas a nossa volta. Em meu consultório, por exemplo, alguns deles (homens ou mulheres) chegam munidos de tablets, computadores portáteis, telefones celulares (mais de um, diga-se de passagem) e, sempre ligados, tornam nossa conversa uma difícil missão de ser cumprida. Há aqueles que fazem uma jornada de 12/14 horas e saem de casa antes de a família acordar e voltam apenas quando todos jantaram ou até já estão se preparando para dormir.

Ambições à parte, vamos lembrar que tudo na vida tem um preço.

Em um estudo publicado no Journal of Experimental Social Psychology, por exemplo, foi demonstrado que pais com um maior nível sócio-econômico – ou mais ocupados com questões que envolvam dinheiro – são aqueles que se tornam menos sensíveis a respeito de seu papel afetivo junto às relações familiares.

"E daí?…", você pode me dizer, "se eles querem se realizar através de seu trabalho, qual seria então o problema?"…

Eu explico: ao tentarmos ser felizes apenas trabalhando, acabamos, sem perceber, negligenciando nossas relações afetivas que são igualmente mais importantes para nosso senso de realização.

E não sou apenas eu a dizer isso. A partir de entrevistas colhidas desde 2010, pesquisadores da Universidade de Lund, Suécia, confirmaram, através de uma pesquisa, que a felicidade está mais ligada aos nossos relacionamentos afetivos (família, amigos e parceiros românticos) do que às coisas materiais que nos cercam.

Os autores afirmam que na coleta de dados chegou-se à conclusão de que as pessoas atingem realmente sentimentos de felicidade e realização mais intensos (e duradouros) quando vivem seus relacionamentos de maneira plena (e não parcialmente).

O que talvez esses profissionais excessivos desconheçam é que o nível de felicidade não aumenta na proporção do ganho econômico, ou seja, embora possamos ficar mais felizes por ganhar mais, esse aumento de satisfação vai até certo ponto e se estabiliza, ou seja, de lá não passa.

Portanto, ainda que essas pessoas possam acumular mais e mais, a felicidade que desfrutam não irá aumentar na mesma proporção.

A saída para esta armadilha? Bem, nada muito difícil: tente ser uma pessoa completa.

Muitas vezes, ao sermos muito bons em alguma coisa, inevitavelmente negligenciamos outras áreas igualmente importantes de nossa vida.

Portanto, eu lhe pergunto: de que adianta ter muito reconhecimento e status profissional se seu casamento, por exemplo, vai por água abaixo? Ou ainda, qual o sentido de ser tão reconhecido em sua empresa se seu distanciamento impacta de forma dramática a vida de seus filhos?…

Curiosamente, nestes casos, os pais sabem que, em suas posições profissionais, sua ausência pode trazer perdas significativas para o ambiente de trabalho, entretanto, no âmbito familiar esta estimativa é simplesmente desconsiderada.

Conclusão: esses pais sabem do seu valor junto à vida profissional, mas não sabem estimar o valor de sua presença na vida privada.

Conclusão

Se você ainda não havia pensado nisso, então eu pessoalmente lhe recomendo. Ao se debruçar sobre as situações adversas, que são derivadas de sua ausência, você realmente se sente feliz?…

Assim sendo, evite trabalhar ainda mais como forma de tentar se esquivar das coisas que não saem como o esperado na vida pessoal, criando assim um círculo vicioso ainda maior (e sem perspectivas de resolução).

A pessoa completa (homem ou mulher), portanto, é aquela que tem olhos para todos aqueles que, de alguma forma, dependem e precisam dela, não apenas no trabalho (e, lembre-se: não basta ser bom em apenas uma coisa). Ser sensível aos sentimentos alheios é de vital importância, principalmente, àqueles advindos dos mais próximos.

Assim, para concluir eu lhe diria: Trabalho e família formam uma combinação muito delicada. Não espere chegar ao final de sua vida para perceber que poderia ter feito tudo diferente.

Reinvente-se!…

Sobre o autor

Cristiano Nabuco é psicólogo e atua em consultório particular há 32 anos. Tem Pós-Doutorado pelo Departamento de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Atualmente trabalha junto ao PRO-AMITI do Instituto de Psiquiatria do HC/FMUSP; Coordena o Núcleo de Terapias Virtuais (SP) e o Núcleo de Psicoterapia Cognitiva de São Paulo. Foi Presidente da Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC). Publicou 13 livros sobre Psicologia, Psiquiatria e Saúde Mental.

Sobre o blog

Neste espaço, são discutidas ideias e pesquisas sobre comportamento humano, psicologia e, principalmente, temas que se relacionam ao cotidiano das pessoas. Assuntos centrais na construção de nossa autoestima, felicidade e vida. Seja bem-vindo(a)!