Topo

Blog do Dr. Cristiano Nabuco

Qual a importância da figura paterna para os filhos? Nova pesquisa explica

Dr. Cristiano Nabuco

08/01/2014 09h00

© Solovyova - Fotolia

© Solovyova – Fotolia

Mesmo com os novos modelos familiares de hoje em dia, razoavelmente distintos daqueles mais tradicionais com que nos acostumamos (em função de muitas separações, novos lares, muitos irmãos simultâneos etc), uma pesquisa recente aponta para a importância que a figura paterna exerce no desenvolvimento dos pequenos e como a figura do pai é complementar às características associadas à figura materna.

Feita nos EUA (e publicada no periódico Cerebral Cortex) e se baseando em respostas observadas inicialmente em modelos animais, a investigação apontou para o fato de que a falta de uma figura paterna bem estabelecida pode prejudicar o desenvolvimento social e comportamental de uma criança.

Os resultados sugerem que, quando os animais sociais (como é o caso de humanos) ficam afastados de figuras paternas, há uma série de sintomas que tendem a se manifestar como resultado. Por exemplo: os indivíduos do sexo masculino ficam mais agressivos, ou seja, mais refratários ao contato social e as fêmeas se tornam muito sensíveis aos estímulos externos, manifestando, em ambos os casos, as claras reações de desamparo e desproteção.

Esta pesquisa ainda foi mais longe, pois demonstrou uma piora no desenvolvimento do córtex pré-frontal do cérebro (que é a sede do controle da impulsividade) quando o núcleo familiar não contou com uma figura que tivesse assumido o papel da figura paterna. Essa é uma das primeiras investigações, inclusive, que revelam um resultado nos níveis neurobiológicos desta privação.

Configurações modernas e papéis complementares

Tenho lido muito a respeito destas novas configurações familiares modernas e muitos autores defendem a ideia de que todos "deveriam" estar mais abertos a estas mudanças, entretanto, se formos considerar que somos o resultado de uma longa história de evolução, é possível então que nossa biologia ainda não tenha tido o tempo necessário para poder se acostumar a estas recentes mudanças sociais, criando assim estes tipos de descompasso adaptativo.

A pesquisa americana, por exemplo, demonstra que o núcleo familiar, ao que tudo indica, só é adaptativo quando as figuras dos cuidadores podem, efetivamente, ocupar papéis claros e complementares, o que resulta em um melhor desenvolvimento no âmbito geral.

É interessante observar também que, de acordo com os autores desse estudo em destaque, diversas pesquisas anteriores, feitas com pessoas cujo núcleo familiar não contava com a figura paterna, indicaram uma mudança comportamental bastante expressiva nos filhos.

Entre os problemas apresentados está, inclusive, uma piora na interação social dos pequenos. As meninas, por exemplo, apresentaram maior risco de desenvolvimento de abuso de álcool e outras drogas e, tanto meninos quanto meninas, igualmente aumentaram o nível de comportamento de risco (afeto mais agressivo, comportamentos mais hostis em relação a terceiros etc).

E quando o pai inexiste?

Vejamos que aqui as coisas podem ficar ainda mais curiosas.

Eu explico.

Esta pessoa (pai, no caso) que possa exercer esse papel de uma figura de apego e proteção aos pequenos, sempre será importante, pois é uma necessidade biológica.

Não sei se você sabe, mas temos operando em nosso cérebro um sistema automático e muito primitivo que, desde nossos antepassados, nos faz buscar a proteção do outro, mais forte. Esse "impulso mental" pode ser visto operando também nos animais e explica o fato de andarem em bando, pois junto com o grupo, a alimentação, o acasalamento e a proteção se dão de forma mais efetiva, garantindo uma maior sobrevivência.

Assim sendo, igualmente nos humanos, quando crescemos, também buscamos instintivamente apoio e proteção de nossos pais. Entretanto, em sua ausência, os pequenos tenderão a buscá-la em outras condições.

Caso não existam estas figuras paternas disponíveis para a criança sentir-se protegida, uma coisa bem interessante acontece.

Quem já não presenciou o fato de ver crianças abandonadas e negligenciadas andando "em bando"? Na adolescência, inclusive, este grupo se transforma em um aglomerado de pessoas que usualmente tedem a cometer mais delitos, perseguir pessoas, agredi-las etc.

Desta forma, o "grupo" se transforma no cuidador maior, transmitindo aos seus membros a sensação de proteção tão almejada.

É possível, inclusive, nos dias de hoje, com pais tão ocupados e sem tempo, que os heróis dos vídeo games estejam assumindo esse papel de identificação e de modelos "postiços". E, cá entre nós, quem sabe dos resultados que isso poderá criar no futuro nessas cabecinhas?

É bom ficarmos atentos.

Sobre o autor

Cristiano Nabuco é psicólogo e atua em consultório particular há 32 anos. Tem Pós-Doutorado pelo Departamento de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Atualmente trabalha junto ao PRO-AMITI do Instituto de Psiquiatria do HC/FMUSP; Coordena o Núcleo de Terapias Virtuais (SP) e o Núcleo de Psicoterapia Cognitiva de São Paulo. Foi Presidente da Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC). Publicou 13 livros sobre Psicologia, Psiquiatria e Saúde Mental.

Sobre o blog

Neste espaço, são discutidas ideias e pesquisas sobre comportamento humano, psicologia e, principalmente, temas que se relacionam ao cotidiano das pessoas. Assuntos centrais na construção de nossa autoestima, felicidade e vida. Seja bem-vindo(a)!