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Uso da internet é ligado ao decréscimo da inteligência verbal em crianças

Dr. Cristiano Nabuco

13/08/2019 04h00

Crédito: iStock

Diferentemente de um passado recente, nos dias de hoje, as crianças gastam uma quantidade de tempo expressiva em frente às telas, sejam tablets com design infantil ou telefones celulares, que são entregues nas mãos dos pequenos, sem muito controle parental. Tudo aquilo que tenha luminosidade, vibre e que seja repleto de aplicativos de fato se tornou preferência da criançada.

Muitos desses eletrônicos e seus aplicativos, segundo insistem seus fabricantes em dizer, são "destinados à educação", embora saibamos que, na sua grande maioria, jamais tenham sido realmente avaliados quanto aos seus reais benefícios e funções.

Os efeitos

É amplamente reconhecido que o uso das telas por crianças e adolescentes, no período da noite, cria efeitos bastante nefastos à saúde, ou seja, o ciclo do sono é um dos primeiros a ser afetado e que, por consequência, ocasiona faltas mais frequentes à escola. Além disso, o uso de celulares por crianças está também associado a menores níveis de performance acadêmica, uma vez que as habilidades analíticas ficam seriamente prejudicadas em decorrência da intensa estimulação digital. E, finalmente, o uso sistemático dos eletrônicos também está associado a baixos níveis de regulação emocional.

O resultado mais imediato é a diminuição da substância cinzenta do cérebro das regiões associadas às habilidades atencionais (traduzindo, o uso desses equipamentos deixa a atenção dos usuários seriamente comprometida), sem falar dos outros efeitos negativos.

O uso excessivo da internet, por exemplo, conforme relatado em outra investigação também foi relacionado à redução das capacidades de compreensão, baixo controle dos impulsos e dos afetos.

A investigação

Um novo estudo queria compreender quais efeitos se observaria no desenvolvimento da fala, visto que outros aspectos já são um pouco melhor compreendidos.

Estudos anteriores de neuroimagem já apontaram que, quando se navega na web, maior é a ativação do córtex orbitofrontal direito –local onde ocorre o raciocínio lógico, tomada de decisões e resolução de problemas — e, como consequência, menor é o estímulo do giro temporal inferior, local onde se processa a linguagem.

Assim sendo, a pergunta a ser respondida foi se o uso da internet pelos pequenos poderia ter efeitos deletérios sobre o desenvolvimento da linguagem, com o passar do tempo, ou seja, se o uso das telas poderia resultar em um declínio da inteligência verbal.

A pesquisa foi conduzida no Japão, junto a crianças usuárias de internet, e as hipóteses foram, em parte, confirmadas.

O que se descobriu foi que o uso excessivo da web, com a passagem do tempo, esteve associado a uma diminuição do volume cerebral, isto é, as áreas ligadas ao processamento verbal foram afetadas pelo uso desmedido das telas e, não apenas a linguagem veio a ser prejudicada, mas a capacidade de atenção decresceu junto a algumas outras funções executivas.

O uso excessivo, por outro lado, se mostrou benéfico apenas no grupo das crianças com baixas habilidades de leitura, entretanto, os efeitos positivos não se mantiveram, com a passagem do tempo.

Conclusão

Muito embora os resultados tenham se alterado, decorrente das distintas faixas etárias e dos diferentes tempos de utilização dos eletrônicos, conforme concluem os pesquisadores, uma coisa é certa: há uma urgência em criarmos um mínimo de consciência a respeito do contato da internet e dos eletrônicos junto às crianças que se encontram em fase de desenvolvimento cerebral.

Os adultos, aqueles que entregam e, muitas vezes, estimulam a sua utilização, precisariam pensar duas vezes antes de fazer o uso dessas ferramentas como parte integrante da vida recreativa cotidiana das crianças e dos adolescentes. Nada substitui a interação afetiva, tão caraterística entre os pais e os filhos e, preenchê-la com as plataformas digitais poderá cobrar um pedágio bastante alto em um futuro próximo. O primeiro efeito, conforme vimos, é o decréscimo da inteligência verbal.

Pense nisso na próxima vez que entregar seu celular a uma criança.

Referência

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/29956399

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Sobre o autor

Cristiano Nabuco é psicólogo e atua em consultório particular há 32 anos. Tem Pós-Doutorado pelo Departamento de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Atualmente trabalha junto ao PRO-AMITI do Instituto de Psiquiatria do HC/FMUSP; Coordena o Núcleo de Terapias Virtuais (SP) e o Núcleo de Psicoterapia Cognitiva de São Paulo. Foi Presidente da Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC). Publicou 13 livros sobre Psicologia, Psiquiatria e Saúde Mental.

Sobre o blog

Neste espaço, são discutidas ideias e pesquisas sobre comportamento humano, psicologia e, principalmente, temas que se relacionam ao cotidiano das pessoas. Assuntos centrais na construção de nossa autoestima, felicidade e vida. Seja bem-vindo(a)!