Pets e nossa saúde
Dr. Cristiano Nabuco
27/01/2015 08h30
Não é segredo para ninguém que os seres humanos têm uma conexão especial com os animais. Pat Shipman, paleantropologista da Penn State University, sugere que esta conexão "homem-animal" vai muito além do simples afeto que imaginamos.
Propõe a pesquisadora que a interdependência dos seres humanos ancestrais com outras espécies animais – a chamada "conexão animal" – desempenhou um papel crucial na evolução humana ao longo dos últimos 2600 anos. (1)
Portanto, estabelecer uma ligação íntima com outros animais é uma tendência não observada em nenhuma outra espécie e, nesse sentido, o convívio próximo nos trouxe uma série de vantagens.
Nos dias de hoje
Não sei se você sabe, mas no mundo todo o convívio com os animais e, principalmente os animais de estimação, atinge marcas espantosas. No Brasil, por exemplo, registra-se a marca de 106,2 milhões de pets em 2014, ou seja, o equivalente a quase um animal de estimação para cada duas pessoas. (2,3)
Intuitivamente já sabemos, e nem precisaria de pesquisas para atestar que a relação que desenvolvemos com os animais de estimação pode ser bastante positiva. Embora não seja das tarefas mais fáceis ter que manejar essa rotina, todo o esforço, no final das contas, vale muito a pena.
Eu explico.
Segundo vários estudos, os donos de animais de estimação são mais saudáveis, possuem maior autoestima e relatam menores níveis de solidão, se comparados aos que não têm animais em casa. (4)
E não é só isso: ter um "pet" em casa também está correlacionado a maior extroversão e menores níveis de medo, segundo a Associação Americana de Psicologia (5).
Entende-se que os animais de estimação possam servir como uma importante fonte de apoio emocional, tornando as pessoas mais conscientes, não apenas para a saúde de seus amigos de estimação, mas também com sua própria saúde. É como se a rotina de cuidado com nossos amiguinhos fosse também progressivamente incorporada por nós, melhorando nossa saúde. (6)
Embora ainda não existam evidências, acredita-se que as relações com os animais apareçam, muitas vezes, em função dos relacionamentos insatisfatórios que se desenvolve em certas fases da vida, fazendo então com que os animais se tornem uma importante figura de apoio, troca de afeto e, além disso, aumentando o senso de pertencimento dessas pessoas (isto é, um verdadeiro antídoto para episódios de isolamento e rejeição).
Portanto, os animais podem beneficiar a vida de seus proprietários, tanto psicológica como fisicamente.
Pets e as crianças
Vários estudos apontam para o impacto positivo que os animais de companhia podem oferecer não apenas aos adultos, mas igualmente aos nossos filhos.
Quer saber alguns exemplos?…
Um estudo mostrou que crianças que tiveram um cão durante o primeiro ano de vida apresentaram uma melhor resposta imunológica (31% menos infecções) do trato respiratório do que aquelas que não tinham seus animais de estimação, ou seja, a exposição a animais de estimação no início da vida pode estimular expressivamente a imunidade infantil. (7)
As crianças de famílias proprietárias de cães também tiveram menos infecções de ouvido – com 44% menos do que as crianças que não possuíam animais em casa -, inclusive, usando menos antibióticos, apontaram os pesquisadores.
Mais efeitos?…
As crianças expostas a um animal de estimação demonstram mais empatia para os seres humanos, se comparadas a crianças não expostas. Ao que tudo indica, trocar afeto com nossos parceiros de quatro patas, exercita nossa capacidade de expressar emoções e sentimentos. (8)
Além disso, crianças que possuem pets estão mais envolvidas em atividades como esportes, passatempos, clubes ou realização ativa de tarefas, se comparadas às que não os possuem. (9)
Famílias pesquisadas em outra investigação relataram um aumento significativo na felicidade de seus membros após a aquisição de animais de estimação. (10)
Outros exemplos?… Crianças com autismo, na companhia de seus pets, apresentaram mais comportamentos sociais do que aquelas sem a presença dos animais em sua casa. (11)
Crianças que possuem animais de companhia, para citar outra investigação, pontuaram significativamente mais em escalas de empatia e de orientação pró-social, do que as não-proprietárias dos pets. (12)
Enfim, os exemplos e os benefícios são inúmeros e, como vimos, não acontecem apenas agora, mas são bastante antigos.
Conclusão
A biologia dos seres humanos, desde seu nascimento, lhe impele na troca de afeto e de emoções como parte importante de nosso desenvolvimento psicológico. Portanto, quanto mais interações tivermos, mais capazes nos tornaremos na vida adulta.
Nada de novo até aqui, entretanto, vale lembrar que uma parcela expressiva das pessoas apresenta maiores níveis de embotamento emocional, o que as impede de praticar essas trocas sociais. Creio então que neste momento os animais de estimação façam seu papel, pois nos acompanham, estimulam e mantêm em operação muitas dessas nossas necessidades emocionais.
É possível que os pets consigam dar aquilo que a vida, muitas vezes, nos privou: o afeto.
Desafio alguém a se recordar de um bom momento de sua infância em que não esteja preenchido da memória de algum animal de estimação. Portanto, lá estarão eles, sempre cumprindo seu papel, ao apaziguar nossas inquietudes e nos ajudar a sermos mais saudáveis.
Referências
- http://science.psu.edu/news-and-events/2010-news/Shipman7-2010
- http://www.petbrasil.org.br/mercado-brasileiro
- http://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/
- Zasloff, R.L. & Kidd, A.H. (1994). Loneliness and pet ownership among single women. Psychological Reports, October, 75(2), 747-52
- http://apa.org/news/press/releases/2011/07/cats-dogs.aspx
- James Serpell PhD: Beneficial effects of pet ownership on some aspects of human health & behaviour, Journal of Royal Science of Medicine, Volume 84, December 1991
- Hesselmar, B,, Aberg, N. Aberg, B., Eriksson, B. & Bjorksten, B. (1999). Does early exposure to cat or dog protect against later allergy development? . Department of Pediatrics, University of Goteborg, Goteborg, Sweden. Clinical Exp Allergy, May; 29(5): 611-7.
- Ascione F. R. (1992). Enhancing children's attitudes about the humane treatment of animals: Generalization to human-directed empathy. Anthrozoös 5 (3) 176-191
- Melson, G.F. (1990). Pet ownership and attachment in young children: Relations to behavior problems and social competence. Paper presented to the annual meeting of the Delta Society, Houston, TX.
- Cain, A.O. (1985). Pets as family members. Marriage and Family Review, 8, 5-10.
- Redefer, L.A. & Goodman, J.F. (1989). Brief report: Pet-facilitated therapy with autistic children. Journal of Autism and Developmental Disorders, 19, 461-467
- Vidovic, V.V., Stetic, V.V. & Bratko, D. (1999). Pet ownership, type of pet and socio-emotional development of school children. Anthrozoös, 12(4), 211-17.
Sobre o autor
Cristiano Nabuco é psicólogo e atua em consultório particular há 32 anos. Tem Pós-Doutorado pelo Departamento de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Atualmente trabalha junto ao PRO-AMITI do Instituto de Psiquiatria do HC/FMUSP; Coordena o Núcleo de Terapias Virtuais (SP) e o Núcleo de Psicoterapia Cognitiva de São Paulo. Foi Presidente da Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC). Publicou 13 livros sobre Psicologia, Psiquiatria e Saúde Mental.
Sobre o blog
Neste espaço, são discutidas ideias e pesquisas sobre comportamento humano, psicologia e, principalmente, temas que se relacionam ao cotidiano das pessoas. Assuntos centrais na construção de nossa autoestima, felicidade e vida. Seja bem-vindo(a)!