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Blog do Dr. Cristiano Nabuco

Por que mantemos pessoas difíceis em nossas vidas?

Dr. Cristiano Nabuco

21/02/2018 04h00

Crédito: iStock

Por mais simples e óbvia que essa pergunta seja, de fato, representa um dos maiores paradoxos de nossa vida. Ter que conviver com pessoas com as quais não mantemos uma boa relação, se torna algo quase que obrigatório em nossa existência.

Foi exatamente isso que uma pesquisa publicada pela revista American Sociological Review procurou analisar junto a uma amostra de 1.100 adultos.

Os resultados apontaram para o fato de que as pessoas difíceis serão, muito provavelmente, mais facilmente encontradas em locais onde não temos muito poder de escolha de nossas relações. Ou seja, quando somos obrigados a transitar por ambientes como, por exemplo, trabalho e ambiente familiar –e de onde dificilmente podemos nos esquivar.

E sabe o que é pior de tudo? Simplesmente, não podemos ignorá-los.

Os entrevistados da investigação foram solicitados a fornecer o nome das pessoas às quais estavam conectados das mais diferentes formas e, ao serem questionados a respeito das relações mais adversas, o número de pessoas apontadas por cada um como de "difícil convívio" atingiu a casa dos 15%. Ou seja, foi como se, a cada dez pessoas, pelo menos com uma, não era possível se manter uma boa relação.

Nada sei a respeito de sua opinião, mas, cá entre nós, nem precisaríamos de uma pesquisa para nos apontar isso, correto? Entretanto, um dado que emergiu merece nossa atenção.

O estudo examinou quais tipos de interações pareciam definir um relacionamento como mais pernicioso e o resultado demostrou que o que mais colaborava com essa percepção foi o fato de que essas pessoas difíceis apresentavam uma maior dificuldade em dar apoio aos demais. Ou seja, ao que tudo indica, ao falharem em sua receptividade, faziam com que uma relação fosse fadada a não prosperar.

Em outras palavras: a incapacidade de exercitar algum tipo de compreensão interpessoal, torna-se, de fato, um dos elementos mais tóxicos para o estabelecimento de qualquer relação.

Vamos lembrar que, quando exercitamos a empatia ["forma de identificação intelectual ou afetiva de um sujeito com uma pessoa, ideia ou uma coisa", de acordo com definição do "Dicionário Priberam da Língua Portuguesa"], começamos a estabelecer um tipo de "ponte emocional".

Quando conseguimos nos colocar no lugar do outro, nem que seja por um breve momento, adquirimos mais habilidades para entender as coisas por outro ponto de vista, o que dá um passo significativo adiante para construção de qualquer relacionamento, por mais fugaz que seja.

Assim sendo, é possível, igualmente à pesquisa, que tenhamos uma parcela de pessoas difíceis em nossa vida –ou seja, nossos 15% "resistentes" aos contatos– mas, também, é possível que fracassemos nessas mesmas ações de diminuir a tensão.

Quantas vezes esperamos que os outros mudem sem que, pelo menos, nos habilitemos sinceramente a tentar mudar? Quantas vezes não estamos nos 15% do grupo dos outros, sem saber?

Para se pensar.

Referência

http://journals.sagepub.com/doi/10.1177/0003122417737951

Sobre o autor

Cristiano Nabuco é psicólogo e atua em consultório particular há 32 anos. Tem Pós-Doutorado pelo Departamento de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Atualmente trabalha junto ao PRO-AMITI do Instituto de Psiquiatria do HC/FMUSP; Coordena o Núcleo de Terapias Virtuais (SP) e o Núcleo de Psicoterapia Cognitiva de São Paulo. Foi Presidente da Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC). Publicou 13 livros sobre Psicologia, Psiquiatria e Saúde Mental.

Sobre o blog

Neste espaço, são discutidas ideias e pesquisas sobre comportamento humano, psicologia e, principalmente, temas que se relacionam ao cotidiano das pessoas. Assuntos centrais na construção de nossa autoestima, felicidade e vida. Seja bem-vindo(a)!